Um blog sem tema à vista. "Singelo" é o melhor adjectivo para o descrever, até porque é bastante foleiro e sem graça nenhuma.
2009-09-01
Clio TT
O milagre aconteceu. O meu velho carro, já com 228.000 Km (metade deles percorridos em contra ordenações graves, muito graves, ou em elevado grau de alcoolemia) aguentou uma viagem de ida e volta ao deserto do Sahara. Fez 4.000 Km sem se queixar e ainda deu boleia a um marroquino que trabalhava num hotel e nos tinha servido o jantar na noite anterior. Chegou perto de nós e com a sensibilidade marroquina perguntou "para onde vão hoje?" e eu "para as dunas de Merzouga" e ele "ah, eu também vou" e eu "ah sim, olha que coincidência do catano" e ele "vocês podem dar-me boleia?". Ia comprar ervinhas para a harira, a sopa do Ramadão, e decidiu ir ver o preço 200 km a Sul. E eu tudo bem.
Conduzir em Marrocos é uma experiência que toda a gente devia ter no curriculum. Para se deixarem de mariquices como parar em vermelhos, deixar pessoas passar, ou mesmo andar a direito. A simplificação é uma coisa maravilhosa. Se só há 2 faixas para cada lado e precisas de ultrapassar, para quê dizer mal da opção urbanística? Criar uma faixa imaginária e acreditar que ela existe é o segredo. Acelera-se a fundo pelo traço contínuo e imagina-se com muita força que existe ali uma bela macadâmia bem delimitada e seguríssima. E funciona. Eu sei, porque adoptei essa estratégia logo em Tânger e estou aqui para contar.
Qualquer grand-taxi marroquino que se preze é um Mercedes 190D com 30 anos. E como é um Mercedes, aguenta com muito marroquino, daí que nunca se ocupem apenas os 5 lugares. Eles imaginam com muita força que aquilo é uma carrinha de 7 lugares e já está, não há cá necessidade de comprar carrinhas panisguinhas. E acreditam com tamanha vontade, que cheguei a ver um desses Mercedes com 3 gajos à frente e absolutamente vazio atrás. Mas não se pense que o trânsito marroquino não tem leis. Tem duas muito importantes: a Lei das Probablilidades e a Lei do Acaso. E eles têm uma coisa que nós não temos: Alá. Só por intervenção divina se explica que não haja um acidente a cada cruzamento ou rotunda, sendo que esta última é uma imitação das rotundas ocidentais, padecendo da maleita se dar prioridade a quem está fora da rotunda e não o contrário.
Alá tem muito trabalhinho. Todo o santo dia a desviar marroquinos uns dos outros... Desviou um da minha frente com uma pinta do caneco, quando eu ia a 100 à hora numa espécie de via rápida e se me atravessa um gajo numa mota daquelas com pedais e eu travo a fundo, aos esses, a ver o marroquino cada vez mais perto de ficar montado no meu capot. No último milissegundo, Alá pega nele e desvia-o para a esquerda. O pior é que os gajos fiam-se tanto em Alá, que nem sequer olham para ver se vem alguém. Simplesmente acreditam.
Foi uma viagem cheia de percalços, mas Marrocos acaba por seduzir os visitantes. A minha namorada, por exemplo, ficou muito agarrada a Marraquexe. Mas foi só por 2 ou 3 segundos, porque depois conseguiu soltar-se do candeeiro onde apanhou a descarga e caiu para o chão.
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15 comentários:
É caso para dizer que a tua namorada viu a luz!
Estou a ver que conduzir em Marrocos é como conduzir no Cairo. Diz-me, os piscas deles também são sonoros, tipo beep, e tu tens que adivinhar para que lado ele vai virar?
Não. Os piscas deles variam desde a não-existência até à sua utilização para complementar as luzes de stop.
Quando um carro trava, é toda uma festa de luz e cor. Já quando vira, é toda uma probabilidade de se dar um acidente.
whooaaaaaaa, vou já lá para a semana, pronto! achas que o meu toyota corolla vintage é gajo para aguentar?
E também optam pela buzina em vez do travão?
A,
Sim, claro. Não vás é de jipe, que eles têm uma estranha tendência para se virar ao contrário. Passei por dois capotados, no Alto Atlas.
AD,
Não é bem uma opção... Na grande maioria das vezes eles não têm mesmo é travões.
Grande aventura! O teu bólide portou-se muito bem:)
Eles simplesmente acreditam… é como tu quando o sinal está laranja!
Grilo, já fazias falta!
(nem acredito que estou a dizer isto)
O teu texto está hilário!
queres trocar o teu carro pelo meu?
Népia. O meu carro agora é como o Piz Buin: Sahara Tested.
Tb estive em Marrocos este verão (e pelo Erg Chebbi, tb). Num das cidades andei de petit taxi (daqueles que qd se fecha a porta temos a sensação que se vai partir, em vez da manivela para as janelas tem fita cola e sempre com o pormenor do lindo tapete no tablier) quando olhei para o conta quilómetros este ultrapassava os 600 mil!!
Também fiquei surpreendida dos portugueses serem logo associados a "batatas-fritas"!
"Batatas fritas, latas de sardinhas"
- Era o que diziam sempre que olhavam para a matrícula do meu carro.
E há um gajo que vem ter comigo e começa assim, num portuguÊs quase perfeito:
"Tás fixe ou vais para Peniche?"
"Tás porreiro ou vais para o Barreiro?"
"Tás bem ou vais para o Cacém?"
- Obviamente, depois tentou vender-me ganza.
Dude, grande texto, pá.
A ver se te contrato para fazeres festas lá em casa sempre que for lá a família.
Na boa. Mas para fazer festas a quem?
AInda não tinha lido isto. Está genial!
P.S. - A tua namorada ficou com penteado à Marge Simpson?
Ela perguntou logo isso, ainda no chão!
"- Diz-me só uma coisa... Fiquei com o cabelo em pé!?"
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