2009-11-26

Chepos Ahoy


Tive a sorte de crescer numa aldeia onde com 7 anos se podia aparecer em casa com 2 dentes na mão e a bicicleta toda partida; ou com um hematoma na testa, um guarda-chuva torto e os raios da bicicleta partidos. Em grande parte, as histórias da minha infância acabavam com a bicicleta no mecânico.

Mas o capítulo da minha aprendizagem com os chepos nada tem que ver com isso, até porque eles não tinham bicicletas. As que lhes davam de vez em quando duravam uma manhã. À tarde já andavam sem pneus a trilhar o alcatrão e a caírem com os queixos no chão. Em compensação, os chepos eram uma quantidade quase incontável de irmãos meio aciganados, todos com uma pancada na cabeça de se lhe tirar o chapéu.

Havia pouca gente no local, mas aos fins de semana juntavam-se aos 2 ou 3 putos residentes (eu incluído) os primos de cada um. Eram dias de combate: quer a jogar à bola, quer a andar à porrada, quer a partir cabeças à calhoada. Lembro-me perfeitamente de ter dado nome à competição: "Normais contra Chepos".

Um dia, depois de ter chovido, decidimos ir para uma zona onde em tempos tinha existido uma exploração de argila. Assim, depois de abandonado, o local parecia-se com o grand canyon (ou assim imaginava eu), e com munições à borla: bolas de barro.

A ideia era ficarem os normais de um lado de um vale e os chepos de outro. Assim fizemos. Quando já o Nuno se preparava para atirar uma bola de barro do tamanho de uma bola da Fifa, dou conta do seguinte: "Epá, pára tudo... Há mais chepos do que normais, não é justo..." e depois de alguma negociação, o André começa a descer a ravina que separava as duas facções e sobe para a do nosso lado.

- Digamos que nesse momento ficou "normal".

Depois de uma intensa batalha, as munições começavam a escassear. Da enorme jazida de argila, restava apenas uma poça de água com calhaus. A nossa mais recente contratação decide aproveitar recursos: pega numa pedra bem bicuda, envolve-a com barro, faz uma bola e arremessa-a com toda a força, direitinha à cabeça do irmão mais novo, acabando ali com a Grande Guerra a favor dos "normais". Acabou, porque o puto começou a perder sangue de uma maneira assustadora e corremos a ajudá-lo, em pânico.

Vira-se o André e diz, com um ar relaxado: "Calma..." e pega numa mão-cheia de barro, faz uma bola humedecida com água e... PAFFFFF! na hemorragia do irmão.

Resultado: Passados 15 minutos o sacana do chepo estava com uma mão a segurar o "curativo" e com a outra a atirar calhaus ao irmão.

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33 comentários:

AD disse...

Tu não tiveste infância, tiveste recruta. Mas pelo menos aprendeste defesa pessoal, primeiros socorros e a lidar com o stress em situações de guerra.

O André era o Deco dos Normais, então.

tiagugrilu disse...

LOL!!!
Exactamente, pá.

E ainda nem sabes da história em que xinei um com o meu x-acto...

Nawita disse...

Isto está muito bom!
Xinas-te um miúdo? Isso é fazer olhos de chinês?

Nawita disse...

deve ser "xinaste"!

tiagugrilu disse...

Xinei pois. Ele não me dava o telemóvel...

AD disse...

Ah bom, se o sóce não te passava o telemóvel para verificares se a bateria dele dava no teu, fizeste bem.

Nawita disse...

Ah… já percebi. Xinar é bater! Ou adquirir de forma violenta o que não nos pertence!

Nawita disse...

Quando andava na escola primária passava por um campo onde costumavam estar alguns ciganos. Eles tinham por hábito xinar-me a mim e aos outros miúdos porque não lhes dávamos o material escolar!

A disse...

xinar é matar, nawita. o tiagu grilu já matou uma pessoa.

Gata das Botas disse...

Na minha terra xinar é aleijar à séria com objecto cortante. E um xino é uma naifa. Ou o meu gato.

A disse...

porque é que falas como se eu não estivesse aqui, gata?

grassa disse...

Xina não é aquela cena onde as pessoas vêm através de riscos e não de olhos?

Bock disse...

Ah, ah, ah, ah!!!!!
Grande posta, Tiagu!

E sim, na minha cartilha, xino é uma faca, pelo que xinava-te todo(a) já se sabe o que é, e não é coisa boa. :)

...a menos que se trate de gente com parafilias esquisitas.

Isa disse...

O relato está excelente e a tua infância deve ter sido violentamente feliz ... ou valentemente, tanto faz.


O mais próximo que conhecia de xinar era xoinar.

tiagugrilu disse...

Ouçam o Bock, que ele é que sabe. Xinar é esfaquear. E sim, fiz isso. Mas foi um cortezito sem importância, a um gajo que todos os dias me acompanhava a casa juntamente com os irmãos e uma bonita chuva de paralelos da calçada.

grassa disse...

Já me xinei a cortar batatas.

...

Não perguntem. Era batata nova.

tiagugrilu disse...

A batata nova é lixada para a porrada.

Nawita disse...

Ah, ok!
Então a mim nunca me xinaram, davam só porradas valentes!

Já as folhas de papel é que são muito perigosas!

AD disse...

Isso é porque escreves em papel ninja.

tiagugrilu disse...

Ou em papel Norris.

Bock disse...

A batata nova é fodida: só mesmo a murro.

El Guru disse...

Também há a Xena, a princesa guerreira, mas não sei como é que ela se dá com as batatas.

Bock disse...

A Xena, como raínha da selva que é, só come batata grelada.

Ana disse...

as biclas podiam ir ao mecanico?? oh pah, se eu na altura me tivesse lembrado disso, tinha pontapeado a minha ainda com mais força (a estúpida fez-me voar por cima do guiador...foi de propósito!).

tiagugrilu disse...

A minha passava lá grande parte do ano. No fim, acabei por lhe partir o quadro, a dar saltos e a cair com os c*rn*s no chão. Tadinha.

Bock disse...

Os quem?

Ana disse...

Eu caí de cornos no chão porque me distraí a olhar pró céu (foi na altura em q passou um cometa). E depois distraí-me e qd dei por ela reparei que estava aos pontapés com a bicla. E que já era de noite. E q estava perdida no mato. Vá lá q o meu pai foi à minha procura. Lá voltei pra casa de bicla dentro do porta-bagagens.

Nawita disse...

Ó Vani, muito te perdias tu no mato...
Cometas é? Não fizeste encontros de 3º grau nem nada? Ou de terceiro degrau, qualquer coisa.

o teu pai não se passava contigo?
o meu teve 5 filhas, coitado!

tiagugrilu disse...

"Muito te perdias tu no mato..."

- Por mim, está feita esta 5.ª feira.

Ana disse...

Por acaso até me perdia :D. E morava por lá, nas abas da serra do caldeirão. Eh pah, encontros desses não, que eu sempre lhes pedi para me deixarem em paz porque ainda não tinha chegado a altura.

O meu pai passava-se comigo, eu passava-me com ele, depois vinha a minha mãe e passava-se com os dois, depois passavamo-nos nós com ela, depois a minha irmã tb se passava...enfim. Éramos uns passados.

Nawita disse...

Vani,

LOL

Lá em casa também era assim! mas com 5 filhas, 1 cão, 1 gato e 2 piriquitos!!

mas nós ainda somos uns passados!

El Guru disse...

Os piriquitos também? E com ovo a cavalo?

Nawita disse...

sempre! regado com uma sumol de laranja e salada à algarvia!